20/04/2009

A REVOLUÇÃO DE ABRIL E A MADEIRA (1974-2000) - a institucionalização da autonomia

Do Estado Novo à Revolução de Abril

Os anos sessenta foram difíceis para o Estado Novo. A Guerra Colonial, que se inicia em 1961, evidenciou a necessidade de mudança no relacionamento com as colónias. Ao nível interno aumentou o descontentamento expresso nos protestos do movimento estudantil de 1969.
A 27 de Setembro de 1968, Salazar é substituído por Marcelo Caetano, mudança considerada como o prenúncio duma viragem, ficando a nova situação conhecida como a "Primavera Marcelista". No entanto, manteve-se a situação das colónias e a revisão constitucional de 16 de Agosto de 1971 não permitiu a abertura constitucional e institucional do regime.
A política colonial portuguesa degradou a sua imagem internacional. Em 1972, a Assembleia Geral e o Conselho de Segurança das Nações Unidas reprovaram a atitude portuguesa, dando apoio aos movimentos de libertação. A República da Guiné-Bissau proclamou a sua independência em 24 de Setembro 1973, seguindo-se as outras colónias.
A pressão interna era grande. A 6 de Janeiro de 1973 iniciou-se a publicação do jornal semanário Expresso, que se afirmou como porta-voz da oposição. De 4 a 8 de Abril realizou-se em Aveiro o 3° Congresso de Oposição Democrática que reclamava o fim da guerra colonial e a defesa das liberdades democráticas.
O descontentamento atingiu também as Forças Armadas quando se publicou o Decreto 353/73 em que era concedida a possibilidade dos oficiais milicianos passarem ao quadro permanente. Esta contestação fez aumentar a oposição ao governo e à guerra colonial. Este movimento dos capitães contestatários ganhou dimensão, surgindo a ideia de derrubar o Governo através de um Golpe de Estado.
Em Fevereiro de 1974 é publicado o livro do General Spínola “Portugal e o Futuro”, contestando a política colonial, propondo uma federação de estados com as colónias, e a necessidade de liberalização do regime. O resultado foi a demissão dos generais Spínola e Francisco Costa Gomes dos cargos de Vice-Chefe e Chefe do Estado Maior General das Forças Armadas. Dois dias depois o Regimento das Caldas da Rainha sublevava-se marchando sobre Lisboa. A rebelião foi apagada mas não fez esmorecer os preparativos da Revolução que aconteceu finalmente na noite de 24 para 25 de Abril de 1974.
O período que decorre a partir da Revolução do 25 de Abril de 1974 foi marcado por uma profunda transformação na vida política do arquipélago. Após o conturbado Verão de 1975 e de 1976, institucionalizou-se a autonomia política na Madeira, entrando num sistema de governo eleito por sufrágio universal directo e iniciou-se a luta pela sua afirmação e do progresso do arquipélago.

As primeiras manifestações na Madeira
O Movimento das Forças Armadas derrubou o regime e entregou o poder à Junta de Salvação Nacional presidida pelo General António Spínola. No dia seguinte o poder estava controlado, saindo para o exílio no Funchal os chefes do regime deposto: Américo Thomaz, Marcelo Caetano e outros.
Na Madeira os ecos da revolução chegaram pelos jornais “Jornal da Madeira” e “Diário de Notícias”. As primeiras movimentações populares surgem em torno do grupo do Comércio do Funchal, chefiado por Vicente Jorge Silva, uma das vozes de oposição ao governo do Estado Novo. Foi no seio deste grupo que surgiu a ideia da manifestação popular do 1 de Maio de 1974. A este juntou-se um outro de padres católicos que se reunia na rua do Pombal e que foi responsável pela contestação ao bispo D. Francisco Santana em 16 de Maio de 1974.
A primeira informação oficial sobre a situação do país surge a 28 de Abril e a 6 de Maio chega à ilha o tenente coronel Carlos de Azeredo, nomeado Governador Militar da Madeira.
A 15 de Maio o general António Spínola tomou posse como Presidente da República. No dia seguinte entrou em funções o Governo Provisório chefiado pelo Dr. Adelino de Palma Carlos, substituído em Julho por Vasco Gonçalves. O novo executivo substituiu o governo do Distrito da Madeira. A 7 de Agosto o Dr. Fernando Pereira Rebelo foi nomeado Governador Civil, que por sua vez a 13 de Setembro nomeou o Dr. António Egídio F. Loja para Presidente da Junta Geral do Distrito Autónomo do Funchal.

Grupos políticos e autonomistas
A partir de Maio de 1974 surgem vários grupos políticos de cariz regional e promotores da autonomia da Madeira, que rapidamente avançaram para a criação de associações regionalistas.
O Movimento de Autonomia das Ilhas Atlânticas, anterior à Revolução, dirigido pelo Dr. José Maria da Silva foi dos primeiros a sair à rua.
A Frente Centrista da Madeira, reuniu Henrique Pontes Leça, António Aragão de Freitas, Alberto João Jardim e Luciano Castanheira, declarava-se a favor de uma "Madeira Autónoma e Próspera", em que o governador deveria ser eleito pelos madeirenses, estando sujeito ao veto de 25 deputados de uma Assembleia Regional. Com a afirmação dos partidos nacionais e a necessidade da sua extensão a todo o território nacional a Frente Centrista associou-se ao Partido Popular Democrático.
O Movimento Democrático da Madeira, fundado pelo grupo de candidatos e apoiantes da oposição democrática às eleições de 1969, sob orientação de António Loja, Fernando Rebelo e Manuel Gouveia, reivindicava a existência de partidos regionais e a saída dos membros do anterior governo ainda em exercício na ilha.
A Frente Popular e Democrática da Madeira, agregava alguns padres católicos e simpatizantes do Partido Comunista, desapareceu em Setembro.
A União do Povo da Madeira surgiu entre os grupos do Centro de Cultura Operária e do Comércio do Funchal, congregando todos os de extrema esquerda. Foram os responsáveis da mobilização popular que esteve na origem da agitação social que ocorreu no Funchal, em Outubro junto ao Palácio de S. Lourenço e a ocupação do Seminário do Funchal. Este grupo aliou-se em 1975 à FEC, estando na origem da actual UDP na Madeira.
No Verão de 1974 estavam constituídos os grandes partidos nacionais, que começam a expandir-se a todo o espaço nacional. O PPD foi buscar o seu apoio junto da FCM, enquanto o PS recrutou os seus aderentes no FPDM e MDM. Apenas os partidos Comunista e Centro Democrático Social fizeram depender a sua base social do apoio de simpatizantes isolados.
De entre estes grupos políticos ganhou dimensão política o MDM que conseguiu assumir o controlo do Governo Civil e da Junta Geral, com Fernando Rebelo e António Loja. Mas isto durou pouco tempo, pois não resistiram à contestação dos outros grupos políticos.
A Junta era constituída pelo Governador Civil e quatro vogais, sendo um deles o Governador Militar, que deveria ser ouvida Sempre que o governo deliberasse no domínio económico- social para o arquipélago.
A 3 de Fevereiro extinguiu-se a Junta de Planeamento da Madeira e a Comissão de Planeamento Regional e deram lugar à Junta Administrativa Regional com o objectivo de criar uma maior descentralização e autonomia administrativa. A Junta era presidida pelo Governador Militar e tinha seis vogais com atribuições nas áreas do planeamento e finanças, administração local, equipamento social e ambiente, transporte e comunicações, assuntos sociais trabalho e emigração, administração escolar, investigação científica, cultura e comunicação social, agricultura, pescas e indústria, comércio e turismo.
Esta representava um avanço em termos de descentralização. Podia elaborar portarias e outros regulamentos que providenciassem a execução das leis, promover a transferência dos poderes da administração central.
O Verão de 1975 foi um momento de grande agitação social e partidária, ficando marcado por alguma agitação e violência. Na Madeira destacou-se a FLAMA, movimento responsável por várias bombas e petardos. O separatismo e a violência bombista são entendidos como um movimento de oposição à política de esquerda seguida por Lisboa, pretendendo desencadear a partir das ilhas a libertação do Continente.
A clarificação do processo político, com a aprovação do Estatuto Provisório da Madeira em 29 de Abril de 1976 e o acto eleitoral para a Assembleia Regional a 27 de Junho, abriu o caminho para a afirmação do processo constitucional com a atribuição da autonomia político - administrativa consagrada na Constituição que foi aprovada a 2 de Abril de 1976.

A Constituição de 1976 e a institucionalização da autonomia
O 25 de Novembro de 1975 consagrou a afirmação da soberania através de eleições livres. A Constituição da República de 1976, estabelece para os arquipélagos da Madeira e Açores um estatuto especial. De acordo com o artigo 6° estes "constituem regiões autónomas dotadas de estatutos político - administrativos próprios". A Constituição estabelece no artigo 232° uma nova figura, o Ministro da República, o representante da soberania do Estado na região, nomeado pelo Presidente da República, mediante proposta do Governo depois de ouvido o Conselho da Revolução, actualmente, depois de ouvido o Conselho de Estado. Ainda se estabeleceu no artigo 302° que as primeiras eleições para a Assembleia Regional decorreriam a 30 de Junho e que até 30 de Abril o Governo estava mandatado a propor, em conjunto com as Juntas Regionais, um estatuto provisório que vigoraria até à elaboração do definitivo.
A autonomia regional, de acordo com o estipulado na Constituição, permitiu à Madeira criar um código normativo jurídico novo e uma administração pública regional. Esta capacidade legislativa e regulamentar fez com que a Assembleia Legislativa elaborasse decretos legislativos regionais, ficando ao Governo Regional a capacidade dos decretos regulamentares regionais e regulamentos inerentes ao exercício do poder executivo, como portarias, despachos normativos e resoluções. De entre estes apenas os decretos regulamentares regionais são assinados pelo Ministro da República.
A mudança constitucional de 1976 foi significativa pois avançou-se no processo de descentralização administrativa para a autonomia política, que possibilitou a criação de um governo próprio e de uma assembleia com capacidade legislativa em casos específicos. Os órgãos de governos próprio são a Assembleia Regional, actualmente composta por 61 deputados eleitos, e o Governo Regional, em que o presidente é nomeado pelo Ministro da República, de acordo como resultado das eleições.
A 19 de Julho de 1976 inaugurou-se a primeira Assembleia Regional da Madeira. A 14 de Agosto o coronel Lino Miguel foi nomeado Ministro da República e a 1 de Outubro a tomada de posse do Governo, presidido pelo Eng. Ornelas Camacho. A norma de ser o líder do partido mais votado a assumir tais funções não teve lugar, pois Alberto João Jardim preferiu ocupar o lugar de líder parlamentar. A situação perdurou por pouco tempo, uma vez que este acabou por assumir a presidência do Governo a 17 de Março de 1978.
No Verão de 1976 estava institucionalizado e em funcionamento o regime autonómico das ilhas atlânticas. Nos primeiros anos o processo esteve sujeito à regionalização e transferência das competências dos diversos serviços do Estado e à criação do quadro institucional, resultado das competências administrativas definidas na Constituição e Estatuto Provisório de 1976. A transferência de competências contribuiu para o reforço de autonomia, sem pôr em causa o Estado unitário.
A Constituição da República, e o estatuto definem de forma jurídico-constitucional a autonomia. A Constituição mereceu já quatro revisões (1982, 1989, 1992, 1997). O Estatuto não mereceu igual adaptação. O estatuto provisório de 1976 manteve-se até 1991, altura em que a Madeira conseguiu aprovar na Assembleia da República o seu primeiro projecto definitivo de Estatuto. A primeira revisão do estatuto em 1999, consagra avanços significativos autonómicos, nomeadamente a Lei das Finanças das Regiões Autónomas de 1998. O Estatuto define os poderes da região, sendo da responsabilidade de Assembleia Regional e aprovado pela Assembleia de República.
As instituições constitucionalmente estabelecidas da região são o Ministro de República e como órgãos de governo próprio, a Assembleia Legislativa Regional e o Governo Regional.
O Ministro da República representa o Estado e de acordo com as suas competências é a garantia constitucional da manutenção do Estado unitário. As suas competências são de ordem política e administrativa. A nível administrativo superintende e coordena todos os serviços centrais do Estado na Região. No campo político nomeia e exonera o Governo Regional, assina e ordena a publicação dos decretos e regulamentos regionais. A partir da revisão constitucional de 1997 deixou de ter assento no Conselho de Ministros e a coordenação dos serviços centrais do estado na região.

Os órgãos do poder regional e os símbolos da Região Autónoma
A Assembleia Legislativa Regional é composta por deputados eleitos por sufrágio universal. De acordo com a lei eleitoral, a ilha foi dividida em onze círculos eleitorais, tantos quantos os municípios, elegendo-se um deputado por cada 3 500 recenseados. O apuramento dos resultados segue o sistema da representação proporcional do método de Hondt. À Assembleia tem a função legislativa, podendo fazê-lo apenas no interesse específico da região, que não pode sobrepor-se à competência da Assembleia da República. Pode regulamentar as leis gerais, adaptando-as às condições da região. A Assembleia actua no sentido de fiscalização do cumprimento do Estatuto e das Leis junto do Governo e na aprovação do orçamento e contas. Ao Tribunal Constitucional está atribuída a missão de controlar a constitucionalidade da legislação regional aprovada pela Assembleia Legislativa Regional.
O Governo Regional, tem por funções conduzir a política executiva da região. O Governo é composto pelo presidente e secretários regionais, podendo ainda haver lugar a vice-presidentes e subsecretarias regionais.
O Estatuto de 1991 estabelece o funcionamento destes órgãos de poder, determinando os seus poderes, regulamenta o funcionamento de Assembleia e Governo, o estatuto de deputado, o regime financeiro, económico, fiscal e a administração pública regional. A defesa da unidade territorial, como forma de afirmação do poder do Estado, está patente na Constituição da República e tem repercussão evidente no Estatuto, fazendo vincar o nível de afirmação da autonomia. O Estatuto dedicava uma secção aos "princípios da solidariedade e da continuidade territorial". Esta ideia foi reafirmada . no Estatuto de 1999, dando lugar a um artigo e secção especial nos . "princípios fundamentais". Aqui o "princípio da continuidade territorial" implica contrapartidas e compromissos acrescidos ao Estado, no sentido de intervir para corrigir as desigualdades estruturais" resultantes do afastamento e insularidade. É um princípio que vincula a solidariedade do Estado e que estabelece obrigações de ordem financeira, de transportes marítimos e aéreos, telecomunicações, rádio e televisão, combustíveis, livros e publicações.
Os elementos simbólicos fazem parte do imaginário autonómico. A bandeira, o escudo, o selo branco e o hino, aprovados pela Assembleia Regional em 28 de Julho de 1978, e o brasão de armas foi em sessão plenária de 17 de Janeiro de 1991. Junta-se o estabelecimento do dia 1 de Julho como o dia da Região.

Os partidos políticos e as eleições
Não obstante em 1976 terem surgido várias associações que poderiam ter-se transformado em partidos políticos regionais, por força da legislação, tiveram de se associar aos nacionais. Foi assim com a UDP e PPD. O quadro partidário da região é definido pela presença dos partidos nacionais que adquirem alguma autonomia em relação às direcções partidárias nacionais. Os actos eleitorais entre 1976 e 2000 contaram com oito partidos e coligações. O eleitorado distribui-se só por cinco forças partidárias (PSP, UDP, PS, CDS/PP e PCP), não conseguindo os demais votações significativas. A única excepção foi o PSN que em 1992 elegeu um deputado. Apenas o PCP ao longo do processo eleitoral tem-se apresentado sob a forma de coligação ( em 1976 com a FEPU - Frente Eleitoral Povo Unido; em 1980 e 1984 a APU - Aliança Povo Unido; em 1988, 1992, 1996 e 2000 a CDU-Coligação Democrática Unitária).

O Governo e a prática governativa
A efectiva governação do arquipélago só teve lugar a partir das primeiras eleições regionais e com a tomada de posse do primeiro governo constitucional em 1 de Outubro de 1976. A intervenção do governo é estabelecida anualmente nos orçamentos. O plano define os objectivos económicos e os meios a atingir através de um desenvolvimento de todos os sectores.
A adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia permitiu os financiamentos necessários para combater as assimetrias e a aposta no desenvolvimento da Madeira.
No período de transição tivemos uma Junta de Planeamento e a Junta Governativa e de Desenvolvimento Regional. A primeira esteve em efectividade de funções de 25 de Março a 5 de Agosto de 1975, enquanto a segunda de 20 de Março a 23 de Abril de 1976. O primeiro governo saído das Eleições regionais, chefiado pelo Engenheiro Ornelas Camacho exerceu funções de 1 de Outubro de 1976 a 3 de Março de 1978. Com a tomada de posse de novo governo, a 17 de Março de 1978, iniciou-se uma nova fase de governação sob a presidência do Dr. Alberto João Jardim, cuja intervenção governamental nos vários sectores da sociedade e economia permitiu significativos avanços nos últimos vinte e cinco anos.
No Porto Santo, sujeita à dupla insularidade, avançou-se em 1978 com a construção da central dessalinizadora e o porto de abrigo. A aproximação desta ilha à Madeira foi conseguida em 1983 com a aquisição de um catamarã para as ligações marítimas. Esta política de afirmação do Porto Santo obrigou à criação de uma delegação do governo regional.
A política de facilitação das acessibilidades e de travar o isolamento, com uma política de transportes e obras públicas, foi uma das principais apostas na Madeira.
Em 1982 avançou-se com o projecto de ampliação do aeroporto intercontinental que se conclui em 2002. A obra das duas fases finais teve o custo total de 106 milhões de contos. Foi considerada um factor de coesão nacional e comunitária, tendo o financiamento, entre 1991 e 2000, em cerca de 65% dos 69.157 milhões de contos dos fundos comunitários.
A aposta no aeroporto resulta do facto de b transporte aéreo ser fundamental para a afirmação do Turismo. A obra do aeroporto era necessária para o turismo um dos sectores preferenciais da economia do arquipélago. Neste sentido foi criada em 1983 a Secretaria Regional do Turismo que se aliou à Cultura.
As conquistas da Revolução de 1974 e o processo autonómico conseguiram estancar a tradicional emigração madeirense, reconvertendo-a para uma sazonalidade rumo às ilhas do Canal. A existência de uma importante comunidade madeirense em todo o mundo levou o governo a dar especial atenção ao sector. A 2 de Julho de 1976 surgiu o Centro do Emigrante Madeirense. Mas a referência à tradição emigratória do madeirense ficou expressa no monumento inaugurado em 1982 na Avenida do Mar e das Comunidades Madeirenses. Depois avançou-se para uma participação dos emigrantes na vida política local através do Congresso das Comunidades Madeirenses. Em 1989 foi declarado o dia 1 de Julho Dia da Região Autónoma da Madeira e das Comunidades Madeirenses.
Na agricultura a aposta foi nas culturas da bananeira e da vinha. A primeira manteve-se apenas enquanto usufruiu uma posição privilegiada no mercado nacional. A vinha tomou um rumo distinto, com a criação do Instituto do Vinho da Madeira (1979): definiu-se uma política de reconversão no sentido de recuperar as castas tradicionais de vinho Madeira.
O sector da saúde foi um dos primeiros a ser regionalizado permitindo que se lançasse um sistema regional, com uma rede de centros de saúde por toda a ilha.
O progresso de todo o arquipélago só foi possível graças a uma política de infra-estruturas imprescindíveis na área dos transportes terrestres e marítimos. A orografia, sem dúvida a maior dificuldade só foi totalmente ultrapassada com a autonomia. Nos anos cinquenta o Estado Novo completou o circuito de estradas à volta da Ilha, mas o esbater das distâncias foi uma conquista dos anos oitenta com os viadutos, túneis e vias rápidas.
A realização de todos estes empreendimentos só foi possível com o apoio financeiro da Comunidade Económica Europeia. A partir de 1986 a adesão de Portugal à CEE facilitou à Madeira o financiamento das obras necessárias. Neste sentido surgiu em 1985 o Fundo Europeu para o Desenvolvimento Regional (FEDER). Em 1991 o Tratado da União Europeia estabeleceu a política regional e de coesão, criando o Comité das Regiões e o Fundo de Coesão. A Madeira recebeu no primeiro e segundo Quadro Comunitário de Apoio (entre 1986 e 1999) 176,7 milhões de contos e para o terceiro (2000-2006) as verbas são de 140 milhões de contos.

A Madeira na União Europeia
O posicionamento periférico da Madeira nunca fez com se afastasse da Europa. No período dos descobrimentos os principais laços estavam na Europa e a partir do século XVII os ingleses a transformaram numa ponte entre a Europa e o mundo colonial.
A entrada de Portugal na comunidade económica europeia permitiu estreitar o vínculo madeirense ao velho continente. A 5 de Junho de 1985 a Assembleia Regional da Madeira aprovou a integração da RAM na adesão de Portugal à CEE, que aconteceu a partir de 1 de Janeiro de 1986. A resolução do Parlamento Regional reconhece as vantagens da adesão para o progresso económico e o reforço do contributo insular para a formação da comunidade.
A situação não relega para segundo plano as especificidades que se reforçam através da coesão económica e social. Estas características particulares da Madeira e dos Açores ficaram definidas no tratado de adesão, assinado a 12 de Junho de 1985. Em 1988 a comunidade perante o memorando apresentado pelas Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores, aprovou um programa de medidas específicas no sentido da sua plena integração no mercado único. Foi o princípio do reconhecimento do "Estatuto Especial das Regiões Ultraperiféricas" consagrado no tratado de Maastricht na Declaração comum sobre as Regiões Ultraperiféricas. A correcção dos desequilíbrios internos de desenvolvimento e a política de coesão comunitária foram assegurados pelos diversos quadros comunitários (1 QCA 1989-1993; II QCA-94-99) e o fundo de coesão, para além de outros apoios no âmbito dos diversos programas comunitários (PEDAD, FEDER, POSEIMA (1992), FEOGA e FSE, que permitiram que a Madeira tivesse assegurados os meios financeiros para combater as assimetrias. As verbas comunitárias foram fundamentais para o desenvolvimento sócio-económico da região e representam a parte mais significativa das transferências do orçamento do estado, que atingem 94% em 1992. Foi com esses fundos que a Madeira venceu o subdesenvolvimento e entrou numa era de progresso e bem estar social.

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Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira:
Preâmbulo
A Madeira manteve o estatuto provisório, aprovado a 2 de Abril de 1976 pela Assembleia da República, até 1991. Em 1977 a Assembleia Regional aprovou o seu projecto de estatuto (publicado por lei n°.103/1 em suplemento ao n°.123 do Diário da República de 30 de Julho de 1977), mas a proposta caducou com a dissolução da Assembleia[decreto n°.98a/79, de 11 de Setembro], acabando por só ser aprovado pelo decreto n°. 322/1 de 27 de Junho de 1980 da Assembleia da República. Não entrou em vigor por ser considerado inconstitucional pelo Conselho da Revolução[resolução nO293/80, publicada no Diário da República 1. série n°.191 de 20 de Agosto de 1980]. Apenas em 1990 se colocou de novo a debate o estatuto da região, que depois de aprovada a proposta pela Assembleia Regional em 22 de Fevereiro foi submetida à Assembleia da República. A primeira revisão do Estatuto Político - Administrativo da Região Autónoma da Madeira foi aprovada por lei n.º 10/99, de 21 de Agosto. Neste é evidente uma melhoria no enunciado das normativas, a incorporação das alterações institucionais entretanto alcançadas e que permitiram uma ampliação da autonomia, bem como a inclusão das disposições tributárias, entretanto regulamentadas.
TÍTULO I Princípios fundamentais
Artigo 1º
Região Autónoma da Madeira
O arquipélago da Madeira constitui uma Região Autónoma da República Portuguesa, dotada de Estatuto Político-Administrativo e de órgãos de governo próprio.
Artigo 2º
Pessoa colectiva territorial
A Região Autónoma da Madeira é uma pessoa colectiva territorial, dotada de personalidade jurídica de direito público.
Artigo 3º
Território
1 - O arquipélago da Madeira é composto pelas ilhas da Madeira, do Porto Santo, Desertas, Selvagens e seus ilhéus.
2 - A Região Autónoma da Madeira abrange ainda o mar circundante e seus fundos, designadamente as águas territoriais e a zona económica exclusiva, nos termos da lei.
Artigo 4º
Regime autonómico
1 - O Estado respeita, na sua organização e funcionamento, o regime autonómico insular e a identidade regional como expressão do seu direito à diferença.
2 - O regime autonómico próprio da Região Autónoma da Madeira fundamenta-se nas suas características geográficas, económicas, sociais e culturais e nas históricas aspirações autonomistas do seu povo.
Artigo 5º
Autonomia política, administrativa, financeira, económica e fiscal
1 - A autonomia política, administrativa, financeira, económica e fiscal da Região Autónoma da Madeira não afecta a integridade da soberania do Estado e exerce-se no quadro da Constituição e deste Estatuto.
2 - A autonomia da Região Autónoma da Madeira visa a participação democrática dos cidadãos, o desenvolvimento económico e social integrado do arquipélago e a promoção e defesa dos valores e interesses do seu povo, bem como o reforço da unidade nacional e dos laços de solidariedade entre todos os portugueses.
Artigo 6º
Órgãos de governo próprio
1 - São órgãos de governo próprio da Região a Assembleia Legislativa Regional e o Governo Regional.
2 - As instituições autonómicas regionais assentam na vontade dos cidadãos, democraticamente expressa.
3 - Os órgãos de governo próprio da Região participam no exercício do poder político nacional.
Artigo 7º
Representação da Região
I - A representação da Região cabe aos respectivos órgãos de governo próprio.
2 - No âmbito das competências dos órgãos de governo próprio, a execução dos actos legislativos no território da Região é assegurada pelo Governo Regional.
Artigo 8º
Sombolos regionais
1 - A Região tem bandeira, brasão de armas, selo e hino próprios, aprovados pela Assembleia Legislativa Regional.
2 - Os símbolos regionais são utilizados nas instalações e actividades dependentes dos órgãos de governo próprio da Região ou por estes tutelados, bem como nos serviços da República sediados na Região nos termos definidos pelos competentes órgãos.
3 - Os símbolos regionais são utilizados conjuntamente com os correspondentes símbolos nacionais e com salvaguarda da precedência e do destaque que a estes são devidos, nos termos da lei.
4 - A Bandeira da União Europeia é utilizada ao lado das Bandeiras Nacional e Regional nos edifícios públicos onde estejam instalados serviços da União Europeia ou com ela relacionados, designadamente por ocasião de celebrações europeias e durante as eleições para o Parlamento Europeu.
Artigo9º
Referendo regional
l - Em matéria de interesse específico regional os cidadãos eleitores na Região Autónoma da Madeira podem ser chamados a.' pronunciar-se. a título vinculativo, através de referendo. por decisão do Presidente da República, mediante proposta da Assembleia Legislativa Regional.
2 - São aplicáveis aos referendos regionais as regras e os limites previstos para os referendos nacionais.

Artigo 10º
Princípio da continuidade territorial
O princípio da continuidade territorial assenta na necessidade de corrigir as desigualdades estruturais, originadas pelo afastamento e pela insularidade, e visa a plena consagração dos direitos de cidadania da população madeirense, vinculando, designadamente, o Estado ao seu cumprimento, de acordo com as suas obrigações constitucionais.

Artigo 11º
Princípio da subsidiariedade
No relacionamento entre os órgãos do Estado e os órgãos de governo próprio da Região é aplicável o princípio da subsidiariedade, segundo o qual, e fora do âmbito das atribuições exclusivas do Estado, a intervenção pública faz-se preferencialmente pelo nível da Administração que estiver mais próximo e mais apto a intervir, anão ser que os objectivos concretos da acção em causa não possam ser suficientemente realizados senão pelo nível da Administração superior.
Artigo 12º
Princípio da regionalização de serviços
A regionalização de serviços e a transferência de poderes prosseguem de acordo com a Constituição e a lei, devendo ser sempre acompanhadas dos correspondentes meios financeiros para fazer face aos respectivos encargos.
(...)(Lei n°.130/99 de 21 de Agosto)

Rui Ferrão
Fontes: História da Madeira, SREM, 2001